Opinião | O Diário da Madrasta, de Fay Weldon



Lembram-se das madrastas das histórias infantis? E das pobrezitas das enteadas subjugadas a todos os caprichos das terríficas madrastas? Lembram-se? Pois então, esqueçam tudo... e leiam este livro!

Sappho é uma jovem escritora que casa, não apenas com Gavin, mas também com o seu passado. Ou seja, com os seus dois filhos, com a falecida esposa e a mãe desta. Até aqui tudo bem, só que Isobel, a encantadora enteada, vai revelando não ser tão encantadora assim...

Vamos sabendo da história de vida de Sappho pela mão da sua mãe, uma convicta psicanalista freudiana, que lê, analisa e interpreta as entradas no diário que a filha lhe confiou num momento de desespero.

No decorrer desta leitura, Emily, mãe da protagonista, vai caminhando passo a passo ao longo dos acontecimentos de vida da sua filha, numa leitura partilhada com o seu actual namorado, também psicanalista, mas jungiano. Este contraponto entre as teorias de Freud e Jung, ambos pioneiros da Psicanálise, mas com visões diferentes e até rivais, traz por si só bastante colorido à narração. Para quem não está tão familiarizado com as diferenças entre Freud e Jung, deixo aqui um velho ditado dos estudantes de psicologia: “Um homem caminha por uma estrada e encontra dois outros homens. O primeiro lhe pergunta de onde ele vem, o segundo, para onde ele vai. Esses dois homens são Freud e Jung”.  

À medida que a leitura vai decorrendo, vamo-nos apercebendo que a forma como Sappho vivenciou e integrou os diversos acontecimentos na sua história de vida, faz com que Emily coloque também em causa o seu papel enquanto mãe, nomeadamente em fases da infância em que a filha se encontrava mais fragilizada.

Com a aproximação do final da história, os acontecimentos sucedem-se de uma forma absolutamente inesperada.

Esta é, sem dúvida, uma história de mulheres. Tudo gira em torno das personagens femininas da história, todas elas fortes, densas e complexas. Umas com valores mais nobres e outras, contudo, perfeitamente maquiavélicas e perturbadas.

Numa época em que o conceito de família tradicional se encontra em mudança, este romance (cuja capa é uma delícia) aflora de uma forma cativante, polvilhada de humor, mas também de tensão e suspense, as surpresas e constrangimentos que a vida a dois pode trazer.  

Gostei bastante e recomendo!

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